Uma experiência com diferentes linguagens
I – O Espírito Santo, dom escatológico
A obra do Espírito Santo tem-se manifestado desde o Primeiro Testamento, inclusive nos anúncios proféticos, acompanhando a esperada vinda do Messias. De fato, há uma linha de profecias que aponta à futura e plena dádiva do Espírito de Deus (Ruah Elohim), caracterizado como “evento escatológico” que, em Pentecostes, inaugura “o tempo da Igreja”[1]. Dentre muitas passagens, temos Isaías 32,14-15 (= Sopro vindo do alto) que nos remete a Atos 1,8 e 2,2; também Isaías 44,3-5, Ezequiel 11,19 com 39,29 e Joel 2,28-29 (= Espírito derramado), que são profecias atestadas por Pedro em Atos 2,17-18. O derramamento do Espírito Santo no Cenáculo não é graça estática, mas dinâmica, com as subsequentes efusões do Espírito em Estêvão (At 6,8), sobre os samaritanos (At 8,14-17), em Saulo (At 9,17), no grupo reunido na casa de Cornélio (At 10,44-46) e na comunidade de Éfeso (At 19,6).
Voltando às profecias, temos ainda Ezequiel 11,19 e 36,26-27 (= Espírito novo infuso) que, por seu mover no coração do crente, aproxima-se da água viva que borbulha no íntimo do Messias e dos fiéis segundo João 7,38 e 19,34-35. Na sua Primeira Carta, João qualifica o dom do Espírito como chrisma (= unção) em 1Jo 2,20-27 – que é um indício escatológico do pentecostes joanino. Paulo, por sua vez, descreve dinamicamente o mesmo Dom como amor de Deus derramado em nossos corações, em Romanos 5,5. Voltando ao Antigo Testamento, Zacarias 12,10 menciona mais uma vez o derramamento do Espírito com referências ao Transpassado, que preanuncia o unigênito de Deus reconhecido no Novo Testamento como o Messias redentor (cf. João 19,34-37 e Apocalipse 1,7).
Nesses textos, a linguagem de fonte judaica relaciona o Espírito-Unção a Jesus-Ungido, usando duas analogias: a analogia da fonte e da água viva (dinâmica do derramamento e da efusão: João 3,5 e 7,37-39); e a analogia do óleo e do fogo (dinâmica de transformação e renovação: Mateus 3,11 e Atos 2,3). O Espírito plenamente dado é igualmente chamado de chrisma (unção) e sphàgis (selo) por João e Paulo, respectivamente, em 1Jo 2,20-27 e 2Cor 1,21. E o próprio Jesus diz aos discípulos, pouco antes da festa judaica de Pentecostes: “Vós sereis batizados com o Espírito Santo em poucos dias” (At 1,5). Assim, podemos falar do batismo no Espírito Santo como derramamento, plenitude, unção, selo, enchimento ou efusão do Dom do Paráclito, seja na Igreja como totalidade do Corpo de Cristo, seja nos crentes como membros vivos deste Corpo. Para todas essas expressões e remissões bíblicas, o Pentecostes é o evento mais explícito (cf. At 2).
Nesta perspectiva de derramamento, efusão e enchimento do Paráclito, temos, no Rito Romano, uma epíclese sobre os comungantes, e não apenas sobre os elementos que serão comungados:
Olhai com bondade a oferenda da vossa Igreja;
reconhecei o sacrifício que nos reconcilia convosco
e concedei-nos que – alimentando-nos com o Corpo e o Sangue de vosso Filho –
sejamos repletos do Espírito Santo
e nos tornemos em Cristo
um só corpo e um só espírito. (Oração eucarística III) [2]
II – Analogias pneumatológicas em Lucas
No rol dos textos lucanos não podemos esquecer a referência à shekiná de Deus sobre Maria, como evento análogo a Pentecostes: “Descerá sobre ti o Espírito Santo, e a virtude do Altíssimo te cobrirá com a sua sombra; pelo que também o Santo, que de ti há de nascer, será chamado Filho de Deus” (Lucas 1,35). O evangelista faz referência remota a 2Samuel 6,2-11 quando a arca da aliança parte em visita às terras de Judá. Na cena do anúncio do nascimento de Jesus, Lucas sugere uma analogia: assim como a Nuvem pousava sobre a antiga arca da aliança, onde guardava-se o testemunho da primitiva Lei, o Espírito pousa sobre Maria e a abriga à sua sombra – qual arca da nova aliança – para que ela guarde em seu ventre o Autor da nova Lei, Jesus (cf. Lucas 1,31-35).
Portanto, assim como a antiga arca visitou as terras de Judá, comunicando alegria e reverência ao jovem profeta Davi (cf. 2Samuel 6,5-9), também a nova arca, Maria, foi usada pelo Espírito Santo nas terras de Judá, para comunicar alegria e reverência a Isabel e o precoce profeta João Batista (cf. Lucas 1,39-43). Davi exclamou: “Como poderá a arca do Senhor entrar em minha casa?” (2Sm 6,9); em paralelo, Isabel exclama: “Como mereço que a mãe do meu Senhor venha visitar-me?” (Lc 1,43).
Assim Lucas estabelece sugestivas conexões pneumatológicas entre os capítulos 1-2 do seu Evangelho e os capítulos 1-2 de Atos dos Apóstolos, traçando o percurso de Belém-Nazaré-Jerusalém como uma teografia da obra do Espírito Santo em Jesus: um percurso marcado por sucessivos “pentecostes” ou “efusões” do Paráclito, à luz do grande derramamento do Cenáculo. É como se o próprio evangelista partisse de Pentecostes para lançar luzes no caminho antes percorrido, ao modo de um evento central de onde a narrativa parte, para depois retroagir até os fatos iniciais da história de Jesus de Nazaré, desde a anunciação de seu nascimento.
Notemos que, além de nos dar uma chave hermenêutica pentecostal para seu Evangelho, Lucas nos proporciona – em sintonia com João 1 – uma síntese teológica do agir salvífico da Trindade, como indica o teólogo ortodoxo Bulgakov[3], ao explicitar que o Verbo se faz carne; e o Espírito se faz dom: “o primeiro Dom [enviado pelo Ressuscitado, da parte do Pai] para santificar todas as coisas, levando à plenitude a Sua obra” (Oração eucarística IV). Deste modo manifesta-se a nós o dar-se salvífico do Pai mediante o Filho, no Espírito Santo, como diz João Paulo II[4].
III – A nova criação e o mistério da Igreja
A vinda do Verbo e o derramamento do Espírito tocam profundamente a humanidade (= sarx na linguagem joanina), como repetem as Escrituras: o Verbo se faz carne (Jo 1,14) e o Pneuma é derramado sobre toda carne (Atos 2,17), de modo que ambos restauram na nossa humanidade a Imago Dei para, assim, operar a nova criação (cf. Colossenses 1,15-20). Mirando mais além no horizonte pascal desta nova criação, contemplamos também o mistério da Igreja – Corpo de Cristo e Templo do Espírito – constituída sinal e início do Reino de Deus entre as nações (cf. Lumen gentium n. 1 e 5)[5]. Pois em Lucas a Encarnação do Verbo e o Dom do Espírito são propostos conjuntamente: em Maria, pelo Espírito Santo, o Verbo se faz homem; depois, em Pentecostes, pelo mesmo Espírito, o Verbo se faz Igreja (analogia pneumatológica entre Lucas 1,30-38 e Atos 2,1-6, com articulação em Atos 1,14).
Nesta perspectiva, podemos compreender o batismo no Espírito Santo como Dom efusivo do Espírito Santo, como dádiva do Pneuma que alcança toda carne, a começar da comunidade reunida no Cenáculo – constituída ekklesía pelo Ressuscitado e assim manifestada em Pentecostes (cf. Atos 2,1-11). Em outras palavras, a Igreja já nasce pentecostal no sentido pneumatológico do termo; congregada, selada e conduzida pelo Paráclito, o mesmo Espírito que operou em Jesus e que opera, agora, em seus discípulos. A Igreja é a comunidade de fé, esperança e caridade, onde o Espírito de Deus habita. Temos, assim, uma compreensão bíblica do batismo no Espírito Santo como dom messiânico de expressão escatológica, manifesto de modo pleno e generoso, como Promessa cumprida e concedida por Deus em seu Cristo. Comentando João 7,37-39 o teólogo Carminati diz:
Com o dom da água, Cristo nos batiza com o Espírito Santo (cf. Jo 1,33; Mc 1,8; Mt 3,11) e nos transmite o Espírito libertador (cf. 2Cor 3,17; Rm 8,2; Ef 1,14; Ef 4,30), capacitando-nos a percorrer os caminhos do êxodo (cf. 1Cor 10,2 com Gl 3,27), sem arrependimentos e sem cansaços; pelo contrário, na alegria e na fidelidade que são justamente os frutos do Espírito Santo (Gl 5,22).[6]
IV – Instância da graça e instância da experiência
De um lado, a compreensão do batismo no Espírito Santo como Dom realizado, ao modo de um Pentecostes contínuo, assinala a instância da graça pela certeza e confiança da Igreja no Dom concedido. Por outro lado, as sucessivas efusões do Espírito Santo entre os fiéis, ao modo de um batismo no Espírito topicamente manifesto, assinalam a instância da experiência, ou seja, os modos como o Dom tem sido experimentado na vida dos crentes, desde os tempos apostólicos até nossos dias. Percebemos esta dinâmica na história das antigas Igrejas de sede apostólica (ortodoxa, oriental, romana e, em certa medida, anglicana), bem como nas Igrejas de matriz reformada e, sobretudo, pentecostal – cada qual com suas ênfases.
As antigas Igrejas apostólicas valorizam a instância da graça, vivendo o Pentecostes contínuo pela caridade e santificação, mediante a celebração da Palavra e dos Sacramentos, com profunda mistagogia; já as Igrejas pentecostais enfatizam a instância da experiência, com manifestações renovadas do Pentecostes, mediante cultos de oração e louvor repletos de manifestações sensíveis. Umas enfatizam o Dom derramado (doação da graça por parte de Deus); outras, o Dom recebido (recepção da graça por parte do crente). Por conta dessas ênfases, as Igrejas usam linguagens distintas, mas convergentes, com base no Novo Testamento.
As Igrejas litúrgicas de herança apostólica (ortodoxa, oriental, romana e anglicana) explicitam o Dom do Espírito na ministração sacramental, como Unção no Espírito Santo que confirma o Batismo em águas e o faz frutificar em dons, ministrada com óleo, intercessões e imposição das mãos do Bispo – celebração chamada chrisma pelos cristãos ocidentais e myron, pelos cristãos orientais[7]. Nos dois casos, o termo provém do óleo usado nesta ministração – o chrisma – mesclado com perfume (myron) de acordo com uma sugestão de Paulo (cf. 2Cor 1,21 com 2,15).
Nesta liturgia crismal as Igrejas ortodoxa, oriental, romana e anglicana celebram o Selo do Espírito, em fidelidade ao culto dos tempos apostólicos: “Vós fostes ungidos com o selo do Espírito da promessa, o Espírito Santo” (Efésios 1,13). Na história dessas antigas Igrejas, muitos testemunhos patrísticos asseveram os efeitos desta Unção, desde os frutos do Espírito até seus carismas. Irineu de Lyon, no início do século III d.C., nos relata:
Em nome de Jesus, seus verdadeiros discípulos, tendo dele recebido a graça, promovem o bem dos demais, cada qual conforme o dom recebido. Alguns expulsam demônios, com tanta certeza e verdade que, muitas vezes, aqueles que foram purificados destes maus espíritos creem em Cristo e se unem à Igreja. Outros manifestam presciência de coisas por vir: eles têm visões e proferem profecias. Outros, ainda, curam os enfermos impondo-lhes as mãos, e os enfermos são restaurados. Além disso, é verdade que até mortos ressurgiram e permaneceram entre nós por muitos anos. (IRENEU, Adversus haereses, Livro II: 32,4)
No mesmo período histórico, Novaciano nos dá este belo testemunho:
É o Espírito Santo quem deu firmeza aos corações e às mentes dos discípulos, quem os iniciou nos mistérios evangélicos, quem os iluminou nas coisas divinas; por Ele revigorados, não temeram as prisões nem as correntes pelo nome do Senhor; antes, subjugaram os próprios poderes e tormentos do mundo, armados e fortalecidos por obra do mesmo Consolador, tendo sido ornados com os dons que este mesmo Espírito difunde e envia, qual joias, à Igreja, Esposa de Cristo. É Ele de fato que, na Igreja, suscita os profetas, instrui os mestres, guia as línguas, realiza prodígios e curas, produz obras admiráveis, concede o discernimento dos espíritos, atribui os encargos de governo, sugere os conselhos, reparte e harmoniza os demais dons carismáticos, fazendo que – por toda a parte e em tudo – seja plenamente perfeita a Igreja do Senhor. (NOVACIANO, De Trinitate, 29.9-10)
Embora tais manifestações tenham declinado em certas épocas e contextos eclesiais, não podemos dizer que houve um total cessar da efusão do Paráclito, nem o fim dos dons espirituais ou carismáticos. Houve certo declínio; mas o Pneuma continuou a agir com eficácia no conjunto da Igreja e na vida dos fiéis que estavam abertos à Sua inspiração. Assim declara o Documento VI da Comissão Internacional de Diálogo Católico-Pentecostal (2015):
Juntos, Pentecostais e Católicos afirmam que, desde Pentecostes, o Espírito Santo tem constituído e animado a Igreja – a nova comunidade escatológica de Deus – levando-a a proclamar e manifestar continuamente o Seu Reino. A partir de Pentecostes, o Espírito capacitou vigorosamente os discípulos para levar adiante a missão do seu Senhor, enquanto Deus corroborava o testemunho do Evangelho com sinais e prodígios feitos em Nome de Jesus e pelo poder do mesmo Espírito (cf. Mc 16,17-18; At 14,3; Hb 2,4). A Igreja é, pois, missionária por sua própria natureza. E o Espírito Santo é o primeiro agente da missão eclesial; é Quem dirige e capacita a Igreja em toda a sua atividade. (Documento VI n. 24)
V – Batismo no Espírito Santo e suas ênfases eclesiais
As Igrejas litúrgicas de sede apostólica (ortodoxa, oriental, romana e inclusive anglicana) continuam ministrando a Unção no Espírito Santo até hoje, reafirmando sua fé na Plenitude ou Selo do Espírito simbolizado no óleo perfumado do chrisma, sob a imposição de mãos do Bispo. A Igreja Católica de sede romana entende esta unção como “efusão especial do Espírito Santo tal qual foi concedido aos apóstolos no dia de Pentecostes”, para que se incrementem no fiel “a virtude […] e os dons do Espírito santo” (CAT n. 1302-1303); assim o mesmo Espírito “perpetua, na Igreja, a graça de Pentecostes” (CAT n. 1288)[8]. A Igreja Ortodoxa de sede bizantina acrescenta que o myron (óleo perfumado) derramado sobre os fiéis significa a nossa “participação na unção de Cristo pelo Espírito”[9]. Notemos que Jesus mesmo chama a vinda do Paráclito em Pentecostes como batismo com o Espírito Santo (cf. At 1,5): assim se dá uma conexão direta entre batismo no Espírito e a unção crismal – seja na doutrina latina, seja na doutrina ortodoxa, pois ambas vinculam a Crisma com a unção messiânica de Jesus e seu derramamento na Igreja, em Pentecostes.
Por outro lado, temos as Igrejas Pentecostais de formação mais recente – sejam pentecostais clássicas, sejam novas comunidades ministeriais – que, embora não usem linguagem sacramental, creem no mesmo Dom do Espírito e o esperam vivamente. As duas tradições – antigas Igrejas apostólicas e recentes Igrejas pentecostais – partem dos mesmos fundamentos bíblicos e evocam o Novo Testamento ao referir-se ao Dom do Espírito Santo para a edificação da Igreja e o testemunho do Evangelho. Contudo, a tradição mais antiga usa linguagem sacramental e enfatiza o Pentecostes como graça contínua, no Sopro consolador e vivificador do Espírito; enquanto a recente tradição dos pentecostais usa linguagem predicativa e enfatiza a manifestação sensível do mesmo Dom do Espírito, pelo Fogo ardente dos carismas. Mas acima de tudo, para as duas tradições, a caridade é a medida de todos os dons (cf. 1Cor 13), em obediência ao mandamento do Senhor: “Nisto todos conhecerão que sois meus discípulos: se vos amardes uns aos outros” (João 13,35).
Deste modo, o batismo no Espírito Santo que atravessou os séculos como ministração sacramental (unção de chrisma ou myron) manifesta-se também na experiência sensível, com sinais e com poder. Esses sinais da ação potente do Espírito Santo costumam ser proclamados na pregação pentecostal-carismática; mas estão presentes inclusive na liturgia católica. De fato, o Rito Romano traz uma lista bem sugestiva desses sinais pneumatológicos: unidade e comunhão dos crentes, força, santidade, enchimento ou plenitude do Espírito Santo (cf. Oração eucarística II, III, IV); diversidade de línguas e unidade de louvor, o próprio Espírito como Dom, renascimento ou regeneração, caridade ardente, viver inflamados do Espírito Santo, derramamento e crescimento dos dons, a diversidade de etnias e sua unidade da fé, a partir de Pentecostes (cf. Missa de Pentecostes); e a lista dos sinais prossegue: instrução interior do Espírito, alegria, iluminação, caminhar na plena verdade, morada interior do Espírito, purificação dos afetos, aperfeiçoamento da caridade, virtudes (retidão, humildade, obediência e gratidão a Deus Pai), santificação, derramamento dos dons, operação de maravilhas (curas, conversões, libertação do mal e testemunho do Evangelho), condução ou governo do Povo de Deus (cf. Missas votivas 7 – Espírito Santo).
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Notemos, ainda, que o fundamento bíblico que as antigas Igrejas apostólicas aplicam à unção sacramental do Paráclito (chrisma ou myron), é idêntico ao que os pentecostais usam para propor o batismo no Espírito Santo (cf. Mateus 3,11; Marcos 1,8; Lucas 3,16; João 1,33 com 3,5 e 7,38-39; Atos 1,5; 2,1-4; 8,14-17; 9,17; 10,44-47 e 11,15-17; com as manifestações de Romanos 12, 1Coríntios 12–14 e 1Jo 2).
A partir desse fundamento bíblico, reconhecemos a permanência do batismo no Espírito Santo e da manifestação de carismas na Igreja, desde o nascimento das antigas sedes apostólicas até hoje – porém, com instâncias e ênfases distintas, seja na celebração dos meios de graça, seja na experiência de avivamento. De fato, católicos, ortodoxos, protestantes e pentecostais partilham a mesma fé e esperança na promessa do Ressuscitado: “Recebereis a virtude do Espírito Santo, que há de vir sobre vós” (Atos 2,8). Esta promessa messiânica não é um fato restrito àquela manhã no Cenáculo (cf. Atos 2), mas é Dom permanente a conduzir, vivificar e santificar a Igreja no curso das gerações: “Porque a promessa vos diz respeito a vós, a vossos filhos e a todos os que estão longe: tantos quantos Deus, nosso Senhor, chamar” (Atos 2,39).
Na Igreja Católica, esta expectativa de um contínuo derramamento do Paráclito se expressa na oração de coleta da liturgia de Pentecostes:
Ó Deus, que, pelo mistério da festa de hoje,
santificais a vossa Igreja inteira, em todos os povos e nações,
derramai por toda a extensão do mundo
os dons do Espírito Santo,
e realizai agora no coração dos fiéis
as maravilhas que operastes
no início da pregação do Evangelho. (Domingo de Pentecostes)[10]
Também o prefácio da Crisma aponta para Pentecostes:
Pela imposição das mãos e a unção real do crisma,
nos confirmais com o selo do Espírito Santo,
Para celebrar o milagre [= admirável evento] de Pentecostes.
(Prefácio da Crisma)[11]
E a oração conclusiva do Ofício de Pentecostes (Laudes e Vésperas) da edição norte-americana, acrescenta:
Pai das Luzes, de quem nos vem toda boa dádiva,
enviai o vosso Espírito em nossas vidas
com a força do vento impetuoso;
e pelas chamas de vossa sabedoria,
abri os horizontes de nossa inteligência.
Desatai nossas línguas para cantar o vosso louvor
em palavras que vão além do poder da fala;
pois sem o vosso Espírito
ninguém jamais poderia proclamar palavras de paz
nem anunciar a verdade de que Jesus é o Senhor
– o qual vive e reina convosco e o Santo Espírito, um só Deus,
pelos séculos dos séculos. (The liturgy of the hours: Pentecost)[12]
Referências:
BULGAKOV, S. Le Paraclet. Paris: Aubier, 1946.
CARMINATI, A. Ele veio pela água e pelo sangue. São Paulo: Paulinas, 1984.
COMISSÃO INTERNACIONAL DE DIÁLOGO CATÓLICO-PENTECOSTAL. Os carismas na vida e na missão da Igreja: Documento da sexta fase do Diálogo Internacional Católico-Pentecostal [Documento VI]. In: LIMA, A.; COSTA, M.; GANDRA, V. (orgs.). O Espírito e as Igrejas. São Paulo: Editora Recriar, 2018, p. 226-267.
CONCÍLIO VATICANO II. Constituição dogmática “Lumen gentium” sobre a Igreja [LG]. In: VIER, F.; KLOPPENBURG, B. (eds). Compêndio do Vaticano II. 22ª ed. Petrópolis: Vozes, 1991, p. 39-113.
JOÃO PAULO II. Carta encíclica Dives in Misericordia” sobre a misericórdia divina [DM]. São Paulo: Paulinas, 1980.
JOÃO PAULO II (promulgação). Catecismo da Igreja Católica [CAT]. Petrópolis: Vozes; São Paulo: Paulinas, 2000.
IRENEU DE LIÃO. Contra as heresias. 3ª ed. São Paulo: Paulus, 2009.
NATIONAL CONFERENCE OF CATHOLIC BISHOPS OF USA. Christian prayer – The liturgy of Hours. New York: Catholic Book Publishing Co., 1976.
NOVACIANO, De Trinitate, 29.9-10 [CCL 4, 70]; apud João Paul II: Encíclica “Veritatis splendor” n. 108. Disponível em: <http://w2.vatican.va/content/john-paul-ii/pt/encyclicals/documents/hf_jp-ii_enc_06081993_veritatis-splendor.html>.
PAPROCKI, H. A promessa do Pai: a experiência do Espírito Santo na Igreja Ortodoxa. São Paulo: Paulinas, 1993.
PAULO VI (promulgação). Missal Romano. São Paulo: Paulinas; Petrópolis: Vozes, 1992.
SCHWEIZER, E. Le Nouveau Testament. In: KITTEL, G (ed.). Ésprit – Dictionnaire biblique. Genève: Éditions Labor et Fides, 1971, p. 127-233.
OBS. Para acessar um estudo bíblico detalhado sobre o Espírito Santo e sua efusão na Igreja, com a presente reflexão como Posfácio, confira:
TORQUATO, Clovis. Teologia do batismo no Espírito Santo. 2ª ed. São Paulo: Editora Recriar, 2019.
https://www.editorarecriar.com/teologia-do-batismo-no-espirito-santo
Dr. Pe. Marcial Maçaneiro, SCJ
Doutor em teologia pela Pontifícia Universidade Gregoriana, Roma.
Teólogo da International Commission for Catholic-Pentecostal Dialogue, Vaticano.
Membro da Red Latinoamericana de Estudios Pentecostales, sede Brasil/CAPES.
Docente do Programa de Pós-Graduação em Teologia da PUCPR, Curitiba;
docente da Pós-graduação em Teologia da Universidade Católica Portuguesa, Lisboa.
Consultor do Instituto Ciência & Fé (PUCPR)
e do Grupo de Trabalho Católico-Pentecostal do Brasil.
[1] SCHWEIZER, E. Le Nouveau Testament. In: KITTEL, G. (ed.). Ésprit – Dictionnaire biblique. Genève: Éditions Labor et Fides, 1971, p. 152-153.
[2] Oração eucarística III, in: PAULO VI (promulgação). Missal Romano. São Paulo: Paulinas; Petrópolis: Vozes, 1992, p. 484.
[3] BULGAKOV, S. Le Paraclet. Paris: Aubier, 1946, p. 156-158.
[4] JOÃO PAULO II. Carta encíclica “Dives in Misericordia” sobre a misericórdia divina [DM]. São Paulo: Paulinas, 1980, n. 7.
[5] CONCÍLIO VATICANO II. Constituição dogmática “Lumen gentium” sobre a Igreja [n. 1 e 5]. In: VIER, F.; KLOPPENBURG, B. (eds). Compêndio do Vaticano II. Petrópolis: Vozes, p. 39 e 42
[6] CARMINATI, A. Ele veio pela água e pelo sangue. São Paulo: Paulinas, 1984, p. 153-154.
[7] Com este termo os cristãos orientais refletem o uso litúrgico judaico, que identifica o óleo das consagrações simplesmente como “perfume” (myrha).
[8] JOÃO PAULO II (promulgou). Catecismo da Igreja Católica [CAT]. Petrópolis: Vozes; São Paulo: Paulinas, 2000, n. 1288, 1302, 1303.
[9] PAPROCKI, H. A promessa do Pai: a experiência do Espírito Santo na Igreja ortodoxa. São Paulo: Paulinas, 1993, p. 114.
[10] Domingo de Pentecostes: Oração do dia. In: PAULO VI. Missal Romano. São Paulo: Paulinas; Petrópolis: Vozes, 1992, p. 318.
[11] Prefácio da Crisma: cf. Ibidem, p. 438.
[12] Father of light, from whom every good gift comes, send your Spirit into our lives with the power of a mighty wind, and by the flame of your wisdom, open the horizons of our minds. Loosen our tongues to sing your praise in words beyond the power of speech, for without your Spirit man could never raise his voice in words of peace or announce the truth that Jesus is Lord – who lives and reigns with you and the Holy Spirit, one God, for ever and ever. In: NATIONAL CONFERENCE OF CATHOLIC BISHOPS OF USA. Christian prayer – The liturgy of Hours. New York: Catholic Book Publishing Co., 1976, p. 605.